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Síndrome do Pânico: Uma Abordagem Psicofísica *

Artigo publicado pela Revista Hermes do
Instituto Sedes Sapientiae SP, numero 3 1998.
Artur Thiago Scarpato**

Resumo:

O presente trabalho desenvolve uma concepção psicofísica do fenômeno da Síndrome do Pânico. Faz um paralelo entre a crise de pânico e o que Freud denominava Neurose de Angústia em 1895, comparando a reação de Pânico à reação de angústia. Explica a fase visual do desenvolvimento infantil e o papel da contração do anel visual como agente atuante nas futuras respostas de pânico. Explicita as relações entre as vivências precoces da criança e os processos de organização da consciência e de identificação com o corpo. Procura demonstrar a ordem implícita nas reações corporais das crises de pânico e seu significado emocional. Caracteriza alguns traços psicofísicos comuns às pessoas que desenvolvem Síndrome do Pânico, como a desorganização do anel visual, a contração crônica do diafragma e o pouco contato com a parte inferior do corpo. Explicita alguns modos de funcionamento destas pessoas nos períodos entre as crises. Propõe uma abordagem psicofísica de tratamento que leve em consideração todos estes fatores.

Abstract:

This works develops a psychophysical conception of the phenomenon of Panic Disorder. It draws a parallel betwen panic attacks and what Freud in 1895 named anxiety neurosis, comparing the response to panic with the response to anxiety. It explains the visual stage of infant development and the role of the contraction of the visual segment as an active agent in future responses to Panic. It makes clear the links between a child’s early experiences and the processes of organisation of the conscience and identification with the body. It aims to show the order implicit in the bodily reactions to panic attacks and its emotional significance. It characterizes certain psychophysical features common to people who develop Panic Disorder, such as disruption of the visual segment, the chronic contraction of the diaphragm and the reduced contact with the lower part of the body. It describes various forms of behaviour of these people in the periods between panic attacks. It proposes a psychophysical approach to treatment wich takes into consideration all of these factors.

“…pode irromper de repente na consciência sem ser despertado pelo curso da imaginação e provoca assim um ataque de angústia. Tal ataque pode constituir somente em sensação de angústia, não associada a nenhuma representação, ou ligada à idéia de morte ou loucura, ou também acompanhada de uma parestesia qualquer…ou unida à perturbação de uma ou mais funções físicas, tais como da respiração, da circulação, da inervação vasomotora ou da atividade glandular.

(…) Eis aqui uma relação das formas de ataque de angústia que até agora me são conhecidas:

a) Com perturbação da atividade cardíaca: palpitações, arritmias breves, taquicardia duradoura…

b) Com perturbação da respiração: formas diversas de dispnéia nervosa, ataques análogos ao do asma, etc….

c) Ataque de suor, às vezes noturno.

d) Ataques de tremores e convulsões…

e) Ataques de bulimia, acompanhados às vezes de vertigem.

f) Diarréias emergentes em forma de ataques

g) Ataques de vertigem locomotora.

h) Ataques das chamadas congestões…denominado neurastenia vasomotora.

i) Ataques de parestesia… “(1)

Estas palavras poderiam ter sido escritas este ano sobre a Síndrome do Pânico, porém foram escritas em torno de 1895 por Freud, ao falar do quadro que ele denominava “neurose de angústia”, em sua obra “A Neurastenia e a Neurose de Angústia”.

Analisaremos o conceito de angústia em Freud nesta época e sua relação com as crises de Pânico. Falaremos então, do conceito de fase visual de desenvolvimento na teoria reichiana e da contração energética do anel visual como fator importante para o desencadeamento da Síndrome do Pânico. Passaremos a uma caracterização dos traços psicofísicos principais que contribuem na resposta de Pânico. Por fim faremos uma proposta de intervenção terapêutica psicofísica voltada tanto para a superação das crises como para uma reorganização mais profunda da personalidade.

Segundo a visão de Freud neste período de sua obra, a angústia provinha de um excesso de energia sexual que não atingia o plano psíquico como representação erótica. Ao invés disto, manifestava-se ainda no plano somático sob a forma de angústia.

Pessoas que tinham uma vida sexual insatisfatória, sofriam de um acúmulo de energia que deixava de estar disponível ao ego. Esta energia ultrapassava a capacidade de integração egóica, tendo assim restrita sua passagem ao plano psíquico, transformando-se em angústia. Angústia era concebida como energia sexual não representável. Havia uma impossibilidade de representação psíquica da excitação sexual e emocional, tendo como conseqüência seu desdobramento em angústia.

Podemos apreender várias coisas da teorização freudiana. A mais importante neste contexto é a de que existe um nível de tolerabilidade a estímulos internos para o ego. Há um limite de excitabilidade emocional e energética suportável e integrável à dinâmica consciente; a partir deste patamar, há um risco de desorganização.

Há uma articulação afeto-representação no funcionamento emocional humano; a todo afeto se liga uma representação. Quando falamos de angústia estamos falando de emoção num estado mais puro, sem representação, no limite entre o biológico e o psíquico. Ultrapassada a capacidade de integração do ego, surge a angústia, como manifestação do limite, da ameaça de morte, do contato com o desconhecido. A angústia é a emoção que acompanha a aproximação do inconsciente, a invasão de conteúdos e emoções que ameaçam rupturas na identidade egóica. É a emoção do nada.

A experiência do Pânico é a experiência da angústia. Angústia pela inundação do ego por fluxos emocionais e energéticos que vêm produzir um abalo sísmico na fina superfície da consciência.

O Pânico reflete uma disparidade entre os planos consciente e inconsciente. Houve um estancamento na comunicação interna, a rigidez do ego anula a tão saudável permeabilidade intra-psíquica. A conseqüência é a ruptura do elo mais fraco; há uma rachadura no represamento do inconsciente por falta de vazão necessária; há uma inundação de águas sobre a consciência.

A brutalidade da Síndrome do Pânico parece ser proporcional à disparidade entre consciente e inconsciente.

A história de vida de cada um vai compondo uma paisagem singular, onde acontecimentos e vivências interiores deixam marcas significativas. Podemos delinear algumas destas marcas e relacioná-las a determinadas problemáticas. É o que faremos em relação à Síndrome do Pânico, identificando elementos comuns que reverberam nas pessoas que têm o Pânico como resposta às questões da vida.

 

A FASE VISUAL

 

O desenvolvimento emocional da criança passa por algumas fases; Reich chamou a primeira delas de fase visual. Esta fase está relacionada às vivências precoces da criança desde as primeiras horas de vida, tendo um limite difuso com a fase oral, apresentando fortes interpenetrações.

Esta fase está relacionada aos primeiros contatos que a criança estabelece com o mundo à sua volta através de seus tele-receptores: olhos, nariz e ouvidos. Os “tele-contatos” ocupam um lugar importante na dinâmica psíquica relacional, sendo que a visão vai fornecer as experiências mais estruturantes deste período.

A criança nasce em estado de fusão energética com a mãe e gradativamente vai se diferenciando para constituir-se como uma unidade energética independente. Algumas aquisições sensoriais e motoras da criança acompanham este processo de separação; entre elas, o desenvolvimento da visão binocular focal, isto é, a capacidade de convergir os dois olhos para formar uma imagem tridimensional dos objetos e discernir a figura do fundo.

O desenvolvimento do olhar está relacionado às primeiras experiências da criança no ambiente que a cerca, em suas buscas de satisfação, contato e orientação. O controle do movimento dos olhos talvez seja uma das primeiras manifestações motoras do ego nascente.

Podemos dizer que há uma gravitação das primeiras experiências da criança em torno da erogenicidade dos contatos visuais. Não pelo simples fato do olho ser uma zona erógena, afinal elas são muitas, mas da experiência visual ocupar um lugar central na dinâmica emocional neste período, de forma que as experiências físicas, cognitivas, afetivas e energéticas, estejam de alguma forma inter-relacionadas à ela, compondo uma certa organização. Isto nos permite falar da visualidade como um organizador psíquico; no mesmo sentido da oralidade, da analidade, etc. Assim também podemos falar de uma fase visual do desenvolvimento emocional.

Nos primeiros momentos de vida, a criança tem ainda poucos recursos internos para se proteger das agressões e das frustrações; suas reações são globais e envolvem a sua totalidade psicofísica.

Uma das formas de proteção possível nesta época é a contração energética de todo o organismo, o que no futuro, poderá contribuir no desenvolvimento das biopatias orgânicas, doenças com acentuada alteração somática. Outro recurso possível à criança, e pelo que parece, um pouco posterior ao primeiro, é a contração do anel visual, levando a uma clivagem entre as vivências corporais e psíquicas, entre sensação e percepção. O anel visual tem a função de integração destes níveis de vivência. Além desta função, está relacionado também à organização da consciência, orientação espaço-temporal, atenção, auto-percepção, contato e expressão emocional e discriminação de limites; todas estas funções sofrem algum tipo de alteração quando há encouraçamento do anel visual.

A contração energética do anel visual traz conseqüências importantes, presentes em diversos problemas emocionais, como as psicoses, os estados de desorganização psíquica, confusão, pânico, etc.

Nos períodos iniciais a criança é extremamente sensível aos estímulos que recebe. Um parto problemático ou um contato materno precário, com olhares frios e agressivos, podem repercutir profundamente naquele ser em suas primeiras experiências.

Uma passagem satisfatória pela fase visual conduz ao que o Dr. Dimas Calegari denomina de centramento da identidade energética. O centramento da identidade energética fornece à criança a sensação de ser ela mesma, identificada com seu próprio corpo e em processo de separação da mãe. Esta é a base sobre a qual a criança vai desenvolver suas singularidades existenciais, avançando em seu processo de diferenciação do mundo e do outro. Neste momento a criança estará estabelecendo sua base de confiança na vida, na qual poderá se entregar ao recolhimento e ao sono, com a garantia de que depois será recebida e acolhida em suas necessidades; de outro modo, poderá ficar alerta, ansiosamente paralisada a meio caminho entre a relação com a mãe e o recolhimento que se segue à satisfação, impossibilitada desta pulsação.

Algumas pessoas passam por esta fase sem um bom centramento de sua identidade energética, trazendo ao longo da vida marcadas tendências simbióticas de retorno à indiferenciação energética mãe-bebê. As vivências de rejeição materna precoce estão entre os principais desencadeadores destes problemas. Estas marcas iniciais poderão ser encobertas por mecanismos egóicos de defesa de fases posteriores do desenvolvimento. A pessoa pode levar a vida lançando mão de recursos egóicos mais maduros até que uma determinada conjunção de fatores venha a desequilibrar a camada superficial da personalidade, trazendo à tona estas problemáticas anteriores.

Parece ser este o caso das pessoas que desenvolvem Síndrome do Pânico. Apresentam uma falha estrutural na direção da simbiose. Quando há uma desestabilização na vida, o sistema entra em pane por falta de base. Falta o centramento da identidade energética, que possibilita a identificação com o corpo, elemento fundamental na estruturação egóica.

Quando falamos das primeiras vivências do bebê, abordamos um terreno obscuro, de registros mnêmicos anteriores à aquisição da palavra. As carências deste período não são acessíveis à interpretação verbal. Os melhores recursos são corporais, imagéticos, etc.

 

 

CARACTERIZAÇÃO PSICOFÍSICA

 

Podemos observar uma série de traços corporais próprios à Síndrome do Pânico. Isto não representa uma simples relação causal, como se determinado aspecto corporal fosse o agente causador de uma situação psíquica. As relações psique-corpo compõe-se de matizes muito mais ricas e complexas. Podemos falar de manifestações em níveis diferentes de um mesmo princípio original, sem que uma manifestação seja causa da outra, mas sim co-presentes, corpo-psique.

Existem alguns fatores que parecem contribuir para que algumas pessoas venham a apresentar Síndrome do Pânico: fatores psíquicos, energéticos e somáticos.

Pessoas com deslocamento superior de energia em conjunto com traços visuais parecem ser mais propensos a desenvolverem Pânico. O deslocamento superior caracteriza-se pelo pouco contato com a base (pés, pernas e quadril) e predomínio do movimento energético acima do diafragma.

O Pânico encontra possibilidades de deflagração num ego que traz marcas de dificuldades na integração da vivência corporal, tendências simbióticas e precariedade ao lidar com emoções e conteúdos internos.

Vamos observar a fenomenologia corporal da crise de Pânico.

Há um fluxo intenso de energia (emoção) em direção à cabeça, desorganizando a auto-percepção da pessoa. Na crise, o movimento energético é ascendente; a energia sobe, sai das pernas (tremor, medo de cair, insegurança) e vai em direção à cabeça. O diafragma se contrai (falta de ar, dificuldade de expirar, náuseas) acentuando o movimento ascendente. O coração dispara, há estreitamento da garganta (sufocamento) e inundação da cabeça (confusão, rubor na face, despersonalização, desorganização da percepção – contração profunda do anel visual). Há também uma contração energética no cerne do organismo e uma expansão desordenada do campo energético.

O fenômeno do Pânico assemelha-se a uma inundação da cabeça por emoções e estímulos além da capacidade de integração da consciência. Há um afluxo de tensão visceral que se irradia para a cabeça e para o campo energético sem conteúdo emocional passível de integração pelo ego.

As pessoas com Síndrome do Pânico apresentam algumas características muito freqüentes em seu funcionamento psicofísico:

  • Desorganização do anel visual, com prejuízos da visão binocular focal.
  • Contração crônica do diafragma, com o peito em posição inspiratória.
  • Pouco contato emocional com a parte inferior do corpo (abdome, quadril, pernas e pés).

Estes traços apresentam profundas intersecções com a dinâmica emocional; espelhando no plano somático, realidades psíquicas de significado profundo.

A pessoa com Síndrome do Pânico parece não estar bem enraizada em seu corpo. Apresenta um aspecto de reação de fuga, de afastamento do corpo. Afastamento dos sentimentos e das sensações. O verdadeiro perigo é interno, de invasão do inconsciente. Há dificuldade em centrar a energia no corpo. Há fragmentação da atenção, como se a pessoa estivesse “meio aqui e meio distante ao mesmo tempo”. A sensação de presença no mundo parece ficar um tanto indiferenciada, perdida.

A pessoa pode passar boa parte do tempo ansiosa, na expectativa de ter uma nova crise. O corpo representa uma ameaça para a pessoa. A tendência defensiva seria de proteção nos meandros do mundo mental e afastamento do corpo – fonte do desconforto e do caos. No entanto, a maior capacidade de suportar a “ansiedade antecipatória” acontece quanto mais identificado com o corpo a pessoa está. Haveria aí uma base para suportar a ansiedade.

A imagem mítica do Deus Pã pode nos iluminar na compreensão do Pânico. A origem da palavra pânico se baseia no terrível medo que sentiam os viajantes ao ouvirem gritos estranhos na floresta; supunham serem esses gritos sinais da aproximação de Pã. Em algumas representações este Deus tem um corpo híbrido, metade animal, metade homem. É inevitável a associação desta imagem ao estado de uma pessoa em crise de pânico. O grande perigo ameaçador está na parte inconsciente e animal não integrada à consciência. Pã simbolizando a natureza, o corpo, a sexualidade, a agressividade…aspectos mais distantes da identidade racional consciente.

Reich percebeu a fragmentação emocional do homem moderno e forjou uma imagem onde o ser humano está divido em três partes: o Homem, Deus e Diabo, que podemos associar respectivamente, à Cabeça, ao Peito e ao Quadril. O quadril como fonte da energia sexual, o abdome como reservatório da maldade, enfim, entre múltiplos sentidos, as partes mais distantes do ego, a sede do Diabo, a morada de Pã.

 

A TERAPIA NA SÍNDROME DO PÂNICO

 

Existem três pilares do trabalho corporal no tratamento da Síndrome do Pânico: o desenvolvimento do contato com a base (pés, pernas, quadril), a soltura do diafragma e a mobilização do anel visual.

A passagem do estado de contração crônica do cerne do anel visual para o de pulsação é dinamizado pela utilização de técnicas específicas de ativação deste anel. Uma das técnicas utiliza-se de uma luz que o cliente deve seguir com os olhos, que se afasta e se aproxima da ponta de seu nariz, ativando simultaneamente a convergência binocular, a visão macular, a concentração da atenção e o centramento de sua energia. Neste processo pode ocorrer também a liberação de afetos trazidos pela mobilização do olhar. Esse é um dos caminhos para restaurar a pulsação desse anel e suas funções, onde estaremos catalisando a integração psique-soma e buscando atingir registros psíquicos precoces relacionados a vivências simbióticas.

A liberação do diafragma é alcançada através de exercícios de respiração abdominal, ampliação da capacidade expiratória e toques profundos.

O trabalho com o diafragma possibilita maior fluxo energético para a parte inferior do corpo. Isto contribuirá na expansão do organismo abrindo outros caminhos de descarga energética, ativando, entre outras coisas, o peristaltismo, melhorando o contato com a base e trazendo possibilidade de tranqüilização e alívio da sobrecarga energética-emocional ascendente.

O contato com a base é desenvolvido em exercícios de contato com as pernas, pés e quadril que permitam maior mobilidade energética e sensibilidade. Exercícios de “grounding”, alongamentos, atenção dirigida, etc.

O trabalho com a base mobiliza o “estar na realidade”, o sentimento de segurança e, juntamente com as outras duas técnicas, facilita a integração de sensações e emoções sexuais e agressivas.

Ao propormos os exercícios precisamos estar o tempo todo atentos às vivências do cliente. Não se trata de exercícios físicos, mas psicofísicos, onde contamos com um setting adequado, uma relação terapêutica, uma disposição psíquica e uma mobilização do corpo.

A pessoa com Pânico tem dificuldade em fazer a integração entre as suas sensações corporais e o significado que estas possam ter, parecendo tudo “sem sentido”, como reações de “enlouquecimento do corpo”. Cria-se um estado de desorientação interna e confusão sobre o que está acontecendo. Um dos objetivos do tratamento é ajudar a pessoa a retomar sua identificação com o corpo, reintegrando as suas sensações e emoções. Estamos trabalhando neste momento com a retomada da auto-percepção, integrando as vivências corporais e psíquicas, mobilizando o anel visual.

O estado de angústia é acompanhado por uma dilatação das pupilas, divergência binocular e predominância da visão do campo. Neste estado, a atenção está difusa e a pessoa tem dificuldade em concentrar-se. Podemos observar que a pessoa em pânico tem muita dificuldade em convergir os dois olhos num mesmo ponto, assim como em discriminar a visão macular da visão do campo da retina, isto é, realçar a figura do fundo.

O desenvolvimento da visão binocular convergente focal unida à capacidade de estar em contato com a sensação do olhar traz várias alterações significativas: acentua a sensação corporal, torna os limites do corpo mais nítidos, equilibra o tônus muscular, aumenta a coesão do campo energético, ajuda a expandir o cerne energético, contribui para a identificação com o corpo, traz a pessoa para o aqui e agora e diminui a ansiedade.

A terapia com estes pacientes caminha na direção da reorganização da personalidade. O paciente com Pânico, inundado por emoções além da capacidade de integração do ego, precisa de recursos para lidar com esta situação. Trabalhamos para acentuar a identificação com o corpo, focalizar e centrar a atenção, afinar as discriminações eu-mundo, adquirir uma compreensão coerente sobre as reações do próprio corpo, ampliando os recursos internos.

Posteriormente, e acentuando-se com o decréscimo das crises, passamos a trabalhar com conteúdos mais profundos, buscando trazer as emoções que antes causaram desorganização para agora poderem ser elaboradas. Este momento é semelhante à abordagem psicoterápica desenvolvida com outros pacientes sem queixa específica. Norteia-se pela estrutura de caráter do paciente e constitui um ponto muito significativo do processo. É o momento de contato com as angústias, com as dores, de mudanças profundas da personalidade; de abandonar as estruturas cristalizadas e arriscar novas possibilidades de vida.

Na experiência clínica com esta metodologia de trabalho, podemos observar que a pessoa deixa de ter as crises em pouco tempo de terapia. A questão crítica passa a ser não mais o Pânico – objetivo superado através da técnica – mas a sensibilização, conscientização e mobilização das questões psicodinâmicas envolvidas, visando mudanças mais profundas da personalidade e assim poder abandonar o fantasma das recaídas.

Um dos critérios importantes ao avaliar-se um tratamento para a Síndrome do Pânico é a sua eficácia na prevenção de futuras recaídas. Pesquisas(2)demonstram que a possibilidade de recaídas é menor quando há intervenção psicológica do que quando o tratamento utilizado é apenas medicamentoso. Pesquisas futuras poderão avaliar a contribuição de uma abordagem psicofísica, como é a perspectiva reichiana, comparada a outras formas de tratamento.

Este trabalho está baseado no trabalho clínico com alguns pacientes em consultório particular. Utiliza-se de uma amostra qualitativamente significativa, pela profundidade do contato, observação e acompanhamento do processo do cliente, e por outro lado numa amostra quantitativamente pequena. Outras pesquisas poderão contribuir neste processo de ampliação do campo terapêutico da Síndrome do Pânico segundo a ótica reichiana.

 

CONCLUSÃO:

 

Consideramos este trabalho como uma proposta terapêutica onde a abordagem sintomática não seja incongruente com uma perspectiva psicodinâmica, mas ao contrário, procure integrá-las dentro de uma compreensão mais ampla, visando superar as problemáticas cisões psique – soma, sintoma – conflito, etc. Um trabalho que objetiva equilibrar a dinâmica energética da pessoa atingindo-a em sua dimensão psíquica, vivencial e inconsciente.

A perspectiva desenvolvida é eminentemente psicossomática concebendo psique e soma como elementos intrínsecos de uma unidade funcional. As técnicas psicofísicas contribuem na mobilização da imagem corporal, na ativação energética e no processo de integração emocional. Por todos estes motivos pode constituir-se num recurso valioso na terapêutica da Síndrome do Pânico.

Notas:

*Este texto pode ser parcialmente reproduzido desde que se faça a referência do autor e da fonte.

Modo de citação sugerido: 

Scarpato, Artur. Síndrome do Pânico:uma Abordagem Psicofísica, Revista Hermes, São Paulo, numero 3, 1998.

 

**Autor: Artur Thiago Scarpato : Psicólogo clínico (PUC SP). Mestre em Psicologia Clínica pela PUC SP. Possui quatro especializações na área de Psicologia: Especialização em Psicologia da Reabilitação pelo HC FMUSP, Especialização em Cinesiologia Psicológica pelo Instituto Sedes Sapientiae, Especialização em Teoria e Técnica Reichiana pelo Pulsar – Centro de Estudos Energéticos e Especialização em Educação Somática Existencial pelo Centro de Educação Somática Existencial. Trabalha em consultório particular com psicoterapia individual e de grupo. Autor de diversos artigos na área.

 

Referências:

1 –Freud, S., La Neurastenia y la Neurosis de Angustia (Sobre la Justificación de Separar de la Neurastenia Cierto Complejo de Síntomas a Título de “Neurosis de Angustia”) in: Obras Completas, Editorial Biblioteca Nueva, 1981, Madrid, vol I, p 184-185.

2 cf. National Institutes of Mental Health, Treatment of Panic Disorder, NIH Consens Statement Online 1991, Sep 25-27;9(2):1-24.

 

* Este texto pode ser parcialmente reproduzido desde que se faça a referência do autor e da fonte.

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