O Estranho que me Habita – Ansiedades, Traumas e suas questões

Avanços no Tratamento do Transtorno do Pânico

No XII Congresso Brasileiro de Psicoterapia Corporal, realizado este ano em Curitiba nos dias 7,8 e 9 de junho, apresentei para os colegas da área uma proposta integrativa de tratamento psicológico para pessoas com Transtorno de Pânico.

Esta proposta busca reunir e integrar recursos que se mostram eficazes para ajudar as pessoas a superarem seus sintomas de pânico e alcançarem uma conexão profunda com os estados internos que agiam subterraneamente no processo que desencadeou o sofrimento.

Para ler o artigo publicado nos Anais do Congresso, clique aqui. (formato pdf).

Ansiedade e Transtornos Mentais em São Paulo

Numa entrevista ao programa Canal Livre da TV Bandeirantes no último domingo, comentei uma ampla e importante pesquisa científica publicada recentemente que avalia a incidência de transtornos mentais na região metropolitana de São Paulo.

Os resultados da pesquisa são preocupantes. Estima-se uma incidência de 30% de transtornos psicológicos na população da região metropolitana de São Paulo, sendo um terço deles em grau severo e a maioria sem estar recebendo nenhum tratamento.

São Paulo é o lugar com maior incidência de transtornos mentais quando comparado a outras regiões metropolitanas pesquisadas ao redor do globo.

A maior incidência é de 19,9% transtornos de ansiedade, seguido de 11% para Transtornos de Humor, 4,2% para Transtornos de Controle do Impulso e 3,6 % para Abuso de Substâncias.

Estes dados apontam para os efeitos da violência urbana sobre a saúde mental. Fatores como criminalidade, trânsito, poluição, desigualdade social, entre outros, parecem estar nos tornando mentalmente doentes.

Devemos ter claro que num transtorno mental, parte do funcionamento mental é capturado pelo sofrimento.

A pessoa é dominada por pensamentos distorcidos, preocupações excessivas, emoções desreguladas (medo, raiva, tristeza), sensações ruins, apatia, desespero, desamparo, comportamentos destrutivos, etc

O sofrimento psicológico consome parte preciosa da vida que poderia ser vivida de outro modo.

O sofrimento psicológico é um fator de empobrecimento vital, limitando drasticamente a capacidade de realização do potencial de cada um. Muito tempo é perdido, muita energia criativa é desperdiçada.

Os transtornos psicológicos são um dos problemas mais sérios da atualidade, o inimigo silencioso, que vai escravizando a alma, corroendo a qualidade dos vínculos, das famílias e dos ambientes sociais.

Dados da Pesquisa:
Andrade LH, Wang Y-P, Andreoni S, Silveira CM, Alexandrino-Silva C, et al. (2012) Mental Disorders in Megacities: Findings from the São Paulo Megacity Mental Health Survey, Brazil. PLoS ONE 7(2): e31879. doi:10.1371/journal.pone.0031879

(por Artur Scarpato)

Do estado reativo de alerta ao estado receptivo de abertura

Uma pessoa cronicamente ansiosa vive em estado de alerta, em estado de ameaça, preparada para que algo possa dar errado.

A pessoa vive num estado reativo, um estado de prontidão para responder ansiosamente a partir de padrões cristalizados no passado. Por exemplo, para uma pessoa com Transtorno do Pânico qualquer estímulo interno pode reativar a ansiedade de uma possível crise de pânico. Para uma pessoa com Transtorno de Estresse Pós Traumático, uma situação pode reativar emoções intensas de traumas vividos. Para uma pessoa com Transtorno de Ansiedade Generalizada, a vida é sempre imaginada como carregada de riscos, ameaças e problemas.

Neste estado de alerta há pouca abertura para experiências novas. A pessoa vive em predisposição para o perigo, onde as experiências facilmente disparam ansiedade, pensamentos negativos e reações fisiológicas de estresse.

Estes padrões cristalizados de alerta e ansiedade tornam a vida da pessoa uma sucessão de experiências repetitivas e carregadas de sofrimento, acompanhadas de uma tendência a comportamentos de recuo e evitação.

É importante sair deste estado reativo e aprisionante e caminhar para um estado receptivo. Enquanto o estado reativo é de repetição automática de padrões (de alerta, de ameaça, de luta e de fuga), o estado receptivo é um estado de abertura ao novo, onde o encontro com o que se apresenta pode despertar respostas inéditas, diferentes do padrão habitual. No estado recetivo há disponibilidade para os encontros e maior clareza na percepção da realidade.

Mas como caminhar de um estado reativo para um estado receptivo?

Precisamos de práticas diárias, o método que realmente funciona para mudanças desta natureza, técnicas praticadas com constância. Precisamos criar presença, trabalhando a mudança do eu centrado no pensamento (eu que pensa) para o eu centrado na experiência (eu que observa).

Como a pessoa ansiosa é escrava dos cenários futuros negativos que sua mente cria, criar presença afeta duas questões centrais:

1 – ajuda a pessoa a parar de sofrer por antecipação

2 – a coloca em contato com aquilo que ela realmente precisa começar a tolerar, sejam suas reações corporais ou os sentimentos de abandono e desamparo.

Criar presença é um passo fundamental para desativar o estado de alerta e entrar no estado receptivo, estar presente na vida.

(por Artur Scarpato)

O ataque de pânico e o sofrimento dos bebês

As pessoas que têm ataques de pânico relatam um sentimento de desamparo e desespero profundos. Elas se sentem a deriva, sem controle, com a sensação de catástrofe iminente.

Esta experiência é tida como estranha pela maioria das pessoas adultas, que não tem lembrança consciente desta experiência.

O que a observação clínica sugere é que a experiência vivida numa crise de pânico possa ter um parentesco com experiências vividas em idade precoce, pelos bebês.

O bebê é totalmente dependente da mãe. Sem a mãe, ou alguém que a substitua, o bebê morreria. Morreria por falta de alimento, por exemplo.
Quando o bebê precisa da mãe e esta se ausenta o bebê chora. Este choro que “chama” a mãe, pode transformar-se num choro de desespero, caso a mãe demore a voltar para aliviar o sofrimento que consome o bebê.

Esta resposta emocional intensa pode estar impressa no cérebro emocional desde tempos remotos, quando habitávamos as savanas africanas. A ausência prolongada da mãe poderia representar o destino fatal de ser deixado para trás, ser devorado pelos predadores ou morrer de inanição.

Este sofrimento é intenso, desesperador e provavelmente incompreensível para o bebê (investigar o que passa na mente dos bebês é uma das áreas mais interessantes de pesquisa em Psicologia).

A sensação de desamparo e desespero vividas por alguém que tem uma crise de pânico parece ter algumas semelhanças com esta experiência do bebê.
O adulto logo busca um sentido para seu sofrimento e sua mente é povoada de interpretações catastróficas para o que vive: estou tendo um ataque cardíaco, vou morrer, vou desmaiar, etc. Quanto mais acredita nestes pensamentos negativos, mais fica ansioso e se desespera.

O que pessoa precisa é aprender a suportar este desamparo, esta angústia sem nome e sem sentido que a toma. Se para o bebê este estado poderia representar a morte, para o adulto em pânico poderia significar um grande sofrimento, porém passageiro e para o qual vai aprendendo a tornar-se cada vez mais tolerante.

(por Artur Scarpato)

O cineasta do terror em nossa mente

A pessoa ansiosa vive tomada de preocupações, expectativas sobre algum perigo que ronda, algo que possa dar errado, que ela possa passar mal… Sua mente é produtora de pensamentos e imagens em série que antecipam perigos e criam cenários catastróficos.

A pessoa vive voltada para o futuro, interpretando os dados atuais como indicadores potenciais de que algo possa dar errado, sair do controle, iniciar algum processo caótico…

Em sua mente começa a se projetar um filme com cenários catastróficos. Longe do momento presente e atenta a este filminho, a pessoa “sofre por antecipação”. Ela ainda não entrou no avião mas já sofre com a idéia de que pode passar mal lá dentro e não tenha como sair. Estando ainda em casa a pessoa sofre ao se imaginar passando mal na frente dos colegas na reunião do escritório. Temendo ter uma crise de pânico a pessoa evita sair e expor-se.

A projeção de cenários de perigo leva a um sofrimento antecipado e a comportamentos de evitação.

Muitas destas expectativas derivam do receio de repetir algum episódio de ansiedade vivido, um medo de repetir um trauma. Porém é comum que a pessoa exagere muito nesta expectativa imaginando que o resultado pode ser muito pior do que foi na última vez…

É importante se diferenciar deste cineasta do terror que cria tantos filmes mentais com enredos e cenários assustadores, deixando o sujeito em estado de sobressalto e ansiedade frequentes.

(por Artur Scarpato)

Enfrentar o medo, mas gradualmente

Uma das características típicas de uma pessoa com um transtorno ansioso é o comportamento de evitação. Por exemplo, uma pessoa com Transtorno do Pânico vai evitar situações onde imagina que possa passar mal ou vai evitar fazer algo que lhe traga alguma sensação corporal temida, uma pessoa com fobia vai evitar a proximidade com aquilo que é objeto de seu temor, uma vítima de estresse pós traumático vai evitar algum estímulo associado ao evento traumatizante, etc.

O comportamento de evitação tem uma função protetora, de buscar prevenir um sofrimento. Porém, ao longo do tempo este comportamento traz um forte revés por manter a pessoa com o medo, impedindo-a de transformar aquela memória emocional que associa uma sensação corporal, um objeto ou uma situação social a perigo.

A evitação acaba tendo um efeito deletério de potencializar e manter o medo, pois a cada evitação aquilo que é temido – seja algo fora ou a própria reação interna de ansiedade – é reforçado na mente como algo ameaçador e que deve ser evitado.

Portanto, para que a pessoa possa superar um transtorno de ansiedade é importante desenvolver comportamentos de enfrentamento, com exposição ao que é temido. Através deste processo ocorre possibilidade de aprendizado e transformação deste padrão ansioso e evitador.

Porém é muito importante frisar que o processo de exposição deve ser gradual, aumentando progressivamente a tolerância da pessoa aos graus crescentes de ansiedade.

Podemos imaginar uma pessoa traumatizada que não entra na água pois tem pavor de se afogar. Simplesmente jogá-la no meio de uma piscina funda não é um bom modo de ajudá-la a perder este medo. Ao contrário, esta experiência pode ter o efeito de retraumatização, aumentando ainda mais o medo e a resistência à mudança.

É comum uma pessoa com Pânico ter medo de sair sozinha e ter uma crise. Muitas vezes a família e os amigos insistem que ela saia sozinha e enfrente seus medos de frente, que seja forte e corajosa. O conselho é bem intencionado, porém desconsidera os riscos de retraumatização.

A exposição à situação temida deve ser gradual, em passos mais lentos, com avanços e recuos, com o tempo necessário para desenvolver:

– habituação às reações internas (emocionais e corporais),
– desenvolvimento da auto-regulação
– superação das associações traumáticas
– diferenciação das cognições negativas

Este processo de exposição gradual e controlado é que ajuda a superar as ansiedades que deixavam a pessoa paralisada, muitas vezes por anos.

A exposição gradual é uma das estratégias e etapas de um tratamento psicológico especializado para Transtornos de Ansiedade.

(por Artur Scarpato)

Comorbidade e o olhar mais profundo

No Transtorno do Pânico a comorbidade é a regra, mais do que exceção. Comorbidade é a presença simultânea ou sequencial de mais de um transtorno numa mesma pessoa.

Observa-se um alto grau de comorbidade do Transtorno do Pânico com:

– outros transtornos ansiosos (fobias, fobia social, transtorno de ansiedade generalizada e estresse pós traumático)
depressão
abuso de substâncias
– alguns transtornos de personalidade, principalmente dos tipos dependente e evitador.

Esta comorbidade indica a necessidade de se utilizar estratégias adequadas para cada caso. Precisamos olhar além dos sintomas, para não correr o risco da “cura aparente”, que traz recaídas recorrentes. O olhar preso a um diagnóstico baseado nos sintomas é como olhar para as folhas de uma árvore e esquecer do resto, não ter uma compreensão global.

Uma pessoa pode apresentar crises de pânico e ter sintomas de estresse pós traumático. Com a terapia, se ela deixa de ter crises de pânico, mas continua sofrendo com os sintomas do trauma, seu sofrimento não terminou. Outra pessoa fica boa do pânico, mas deprime, então seu tratamento está incompleto. Uma compreensão profunda do caso implica em se abordar a situação mais profundamente.

Precisamos olhar além das folhas da árvore e ver o tronco que unifica estes sintomas, chegar à raiz de onde brota o sofrimento, analisando a família onde a pessoa cresceu, sua história de vida, seus traumas, suas respostas aos desafios que a vida lhe trouxe, enfim, todos os fatores que contribuíram para ela ser como é hoje e sofrer do modo como sofre hoje.

É importante uma compreensão integrada que resolva os desequilíbrios internos daquela pessoa, permitindo uma solução terapêutica que vá além de controlar este ou outro sintoma, que poderiam sempre retornar enquanto o problema original não for resolvido.

(por Artur Scarpato)

Precisamos ir além da interrupção dos ataques de pânico

Chega um momento no tratamento do Transtorno do Pânico em que a pessoa não tem mais crises. Ela está livre daqueles ataques de pânico que causavam um sofrimento intenso e limitavam tanto sua vida. Sem dúvida uma vitória muito importante foi obtida. Porém engana-se quem considera que o tratamento psicológico esteja completo com o fim das crises.

O que a observação clínica aponta é que muitas pessoas ainda continuam a viver limitadas por outros sintomas de ansiedade, não tão agudos e dramáticos como os ataques de pânico, mas ainda assim produtores de considerável sofrimento. A pessoa não tem mais crises de pânico, mas continua a apresentar sinais claros de ansiedade: expectativas de que o pior aconteça, medo de sensações e emoções mais intensas, comportamentos de evitação, etc.

Por exemplo, a pessoa percebe que frequentemente está alerta, esperando pelo pior, com pensamentos automáticas negativos e fantasias catastróficas em relação aos eventos de sua vida.

É comum a pessoa ainda se assustar com o que sente, não mais a ponto de ter uma nova crise de pânico, mas o suficiente para ela ficar inquieta e desconfiada de que tem algum problema sério, alguma doença, algum outro problema psicológico.

Livre das crises de pânico a pessoa volta a fazer muitas coisas que não fazia antes, mas é comum manter algumas estratégias de evitação, como evitar alguns lugares ou situações onde a pessoa teme que possa ainda vir a passar mal.

A observação clínica parece indicar que estas pessoas permanecem mais vulneráveis a recaídas após algum evento ou situação estressante. Na verdade elas ainda estavam bastante desreguladas, apenas não o suficiente para apresentar as crises de pânico.

Temos que trabalhar para que a pessoa caminhe além da superação das crises, que possa aumentar muito sua capacidade de tolerar estados de ansiedade, que desenvolva maior capacidade de auto-gerenciamento e mantenha uma sintonia fina com seus processos internos e sua vida.

* por Artur Scarpato

Ansiedade na Mídia

Participei do programa Alternativa Saúde no canal GNT falando sobre Ansiedade e Transtorno do Pânico.
O programa foi ao ar em diversos horários e o feedback recebido dos telespectadores foi excelente.

por Artur Scarpato

Do Controle à Confiança

A ansiedade deriva de um sentimento de vulnerabilidade. Estar ansioso indica que me sinto sob alguma ameaça. O perigo/ameaça pode vir de dentro ou de fora de mim, pode ser um estado interno que eu não dou conta ou uma situação que oferece alguma ameaça para mim.

No estado de ansiedade este perigo é indefinido, mas vai ganhando contornos visíveis na consciência e vai virando medo: medo de morrer, medo de ter uma doença grave, medo de passar mal, etc. A ansiedade – emoção indefinida – tende a virar medo – emoção definida.

Há uma antítese entre confiança e controle. Quanto menor a confiança maior a busca de controle. Quanto maior a tentativa de controle, menor o sentimento de segurança e confiança.

O problema é que a atitude controladora vai levando a uma insegurança cada vez maior, pois as coisas, tanto de fora como de dentro de nós, sempre teimam em escapar ao controle. Quando percebemos já estamos reagindo a algo, nosso corpo já se apresenta agitado, o medo já está agindo dentro de nós, a emoção já se instalou. E o mesmo acontece com as preocupações, os pensamentos ruminativos, as lembranças intrusivas… como temos pouco controle de nós mesmos.

O eu, o ego é só uma película que fica entre um mundo grande fora de nós e um mundo grande dentro de nós. Nesta película está nossa pequena consciência, da qual temos um controle só parcial e num território menor ainda está aquilo que podemos controlar. O caminho não está em aumentar o controle, mas em buscar diálogos e harmonia, harmonia com o mundo externo e harmonia com o mundo interno.

Assim frente a ansiedade, uma emoção que sinaliza que nos sentimos vulneráveis, precisamos (1) observar e aceitar a emoção e (2) buscar as razões e disparadores desta emoção-sinal.

O que está nos ameaçando? Uma ameaça real? Uma avaliação equivocada de nossa capacidade de lidar? Uma catastrofização que exagera a avaliação negativa das consequências de um evento? A repetição de um trauma que não nos abandona?

Aceitar a ansiedade e rever seus disparadores vai permitindo que ela vá se assentando em dimensões menos sofridas, vai nos harmonizando com os mundos de fora e de dentro, vai potencializando a confiança e diminuindo a atitude de controle.

(por Artur Scarpato)

Do "eu que pensa" ao "eu que observa"

A ansiedade é uma emoção voltada para o futuro. O corpo da pessoa está presente, mas sua mente está voltada para o futuro, esperando que algo de ruim aconteça.

A pessoa fica dividida: parte dela está presente e parte dela está se projetando para frente, num cenário construído mentalmente cheio de incertezas, perigos, etc.

Toda pessoa que apresenta algum transtorno ansioso (Transtorno do Pânico, Fobias, Transtorno de Ansiedade Generalizada, Transtorno Obsessivo Compulsivo, etc) vive esta divisão interna, com forte projeção mental no futuro, mesmo que num futuro próximo, criando na mente cenários que fazem a pessoa sofrer intensa e constantemente por antecipação: “vou passar mal”, “vou ter aquilo de novo”, “vou morrer”, “vai dar errado”, etc.

Caso a pessoa conseguisse mergulhar em seu momento presente, a ansiedade tenderia a diminuir dramaticamente, ou mesmo se dissolver. Quando a mente retorna para as pre-ocupações com o futuro, a ansiedade reaparece.

Um primeiro modo de se fazer presente é se observar, se perceber, mesmo estando mentalmente preocupado com o futuro.

Então, feche os olhos e observe seus pensamentos. Dedique alguns minutos a isto.

Os pensamentos no estado ansioso geralmente seguem padrões repetitivos, manifestando preocupações – “estou passando mal”, “devo ter uma doença séria”, “aquilo vai acontecer de novo”, “e se der errado” etc – criando cenários catastróficos, levando você a se sentir cada vez mais ansioso. Estes pensamentos automáticos negativos mantém a ansiedade ali, te consumindo.

Desenvolver o “eu que observa”

Apenas observe e comece a aprender sobre você e seu funcionamento mental. Comece a perceber como há automatismos de pensamento que dominam sua mente e levam você a se sentir cada mais ansioso.

Durante o exercício não tenha pressa e não espere nenhum resultado imediato. A pressa é um sinal de quem está voltado mentalmente para o futuro e seu objetivo agora é enraizar sua presença no agora, numa atitude de espectador e de não identificação com os pensamentos. Não se preocupe de tentar parar ou mudar os pensamentos, mas reconhecer estes automatismos que eternizam sua ansiedade. A meta agora é de reconhecimento/aceitação e não de controle.

Você vai começar a perceber que o perigo não está no aqui e agora, mas é cultivado através destes pensamentos negativos e catastróficos. Você pode perceber que surgem em sua mente pensamentos de julgamento e controle: “eu não deveria estar sentindo isto”, “meu coração não está normal”, “isto não deveria estar acontecendo”, etc

Quando você sai da identificação com o “eu que pensa” e passa a centrar sua consciência no “eu que observa””, você começa a enfraquecer estes padrões automáticos de pensamnto, retira parte de sua energia e começa a criar uma nova experiência interna. Este é um primeiro passo.

(por Artur Scarpato)

Sensibilidade à Ansiedade: o medo do medo

Um fator comum nas pessoas que apresentam um Transtorno de Ansiedade (Pânico, Fobias, etc. ) é a Sensibilidade à Ansiedade (Anxiety Sensitivity, em inglês).

A Sensibilidade à Ansiedade é o medo dos sintomas decorrentes da ansiedade, assim como a crença de que esses sintomas possam produzir danos psicológicos, físicos ou sociais.

Geralmente estes medos agrupam-se em três dimensões:
1) medo dos sintomas físicos (taquicardia, tontura, mãos úmidas, etc)
2) medo de descontrole mental
3) medo que os sintomas possam ser vistos pelos outros

Pesquisas apontam que as pessoas que apresentam índices altos em testes de Sensibilidade à Ansiedade terão uma probabilidade maior de vir a desenvolver um Transtorno de Ansiedade. Ou seja, a Sensibilidade a Ansiedade pode preparar o terreno para algumas pessoas desenvolverem um Transtorno de Ansiedade.

Este traço de Sensibilidade à Ansiedade parece ser desenvolvido ao longo da vida, através de algumas experiências como:

(1) experiências pessoais difíceis como doença, acidente ou perdas
(2) contato com o sofrimento de outras pessoas, que adoeceram ou morreram, por exemplo.
(3) contato com pessoas próximas que tinham medo das sensações corporais, medo de ficar doente, etc.
(4) ter sido criado por pais que apresentavam excessivo cuidado, com ansiedade e superproteção relacionados ao bem estar físico.

É importante ajudar a pessoa a ir superando este medo das reações de ansiedade, aumentando a tolerância ao que sente e aumentando a confiança em si mesma.

(por Artur Scarpato)

Deixar vir, uma atitude a ser conquistada

A crise de pânico parece uma ameaça de ruptura interna, onde o “eu” é invadido por forças que o ultrapassam. O “eu” é aquilo com que me reconheço e me identifico, minha identidade, meu pensamento e meu corpo, como eu habitualmente os reconheço, dentro de certos padrões de estabilidade e funcionamento.

De repente as reações que brotam em mim parecem descontroladas, o coração começa a bater sem razão, as mãos gelam, a mente produz pensamentos catastróficos, e eu não tenho mais controle…

Eu fico como um barco à deriva numa tempestade de ondas gigantes, descontrolado, inundado, podendo virar e afundar a qualquer momento; não há nada que eu possa fazer, nem um lugar seguro onde eu possa ficar. É o estado de pânico puro.

Com a repetição destas experiências, a tolerância da pessoa às suas reações corporais vai diminuindo, ela passa a temer cada vez mais as reações em seu corpo, começa a monitorar cada sensação diferente como possível sinal de perigo e a evitar fazer coisas que possam causar reações temidas. Inicia-se assim um processo de restrição, limitação progressiva e perda de segurança.

O processo de superação deste estado de insegurança está em (1) compreender melhor as reações que estão ocorrendo para se deixar de tentar (impotentemente) lutar contra as ondas e (2) gradativamente, aumentar a tolerância a estas reações do corpo para que a pessoa possa aprender a conviver com certo grau de descontrole sem acreditar erroneamente que este estado vai levá-la ao colapso. Quanto mais a pessoa teme suas reações, quanto mais se desespera pela falta de controle, mais ansiosa fica e consequentemente maiores serão as reações em seu corpo. É a luta contra o descontrole e o entrar em desespero pelo que está ocorrendo que criam um estado mais caótico dentro de si.

Deixar vir, esta é uma atitude a ser conquistada.

Na verdade, a tempestade da crise de pânico não é capaz de “virar o barco”, apesar da pessoa acreditar piamente, durante uma crise, que seu barco está afundando.

(por Artur Scarpato)

Diminuir a Ansiedade Basal

A pessoa com Transtorno de Pânico geralmente passa o dia num estado de ansiedade razoável. O nível de ansiedade pode variar ao longo do dia, mas está sempre lá, causando desconforto, apreensão e expectativa que algo ruim possa acontecer.

O padrão emocional da pessoa é como um copo de água que está quase cheio, onde falta muito pouco para transbordar. É só entrar um pouco de água – no caso, preocupção mental, excitação fisiológica ou emocional – e o copo transborda, levando a uma crise de pânico.

A pessoa vive num estado pré-crise, com um nível basal de ansiedade alto, com pensamentos negativos, alerta mental, respiração curta, etc.

Precisamos trabalhar para diminuir o nível da água do copo, desorganizar o padrão de ansiedade, pois assim a pessoa se torna menos vulnerável a ter novas crises. O foco não deve ser só no controle das crises, mas em trabalhar sistematicamente para regular o nível de ansiedade basal que deixa a pessoa predisposta a inundações, a ter novas crises de pânico.

(por Artur Scarpato)

Enraizar a presença no aqui e agora

O estado mental da pessoa ansiosa é caracterizado por flutuações no processo de atenção. A atenção passa a oscilar entre estados de dispersão e estados de preocupação excessiva. A mente passeia, sai de um devaneio perdido para se fixar em alguma preocupação ansiosa. Surgem preocupações sobre tragédias que poderiam acontecer, levando a pessoa sofrer por antecipação.

Neste processo a consciência se afasta do momento presente. A ansiedade crônica vai enfraquecendo a capacidade da atenção, vai deixando a mente à deriva, entre preocupações e devaneios, alimentando a ansiedade e o sentimento de impotência. Daí a queixa comum entre as pessoas muito ansiosas, de terem dificuldade de concentração.

A atenção é como um músculo que precisa ser treinado para se fortalecer. No caminho de diminuição da ansiedade precisamos fortalecer a capacidade de dirigir e sustentar a atenção.

A ansiedade é a emoção que ocorre quando há uma expectativa de perigo, que algo ruim possa acontecer no futuro. Quanto mais presente a pessoa estiver, menos ansiosa ficará. Assim precisamos trabalhar para criar presença. Há técnicas para isto, para aprender a observar, a se auto-observar e a sustentar a atenção. É um caminho importante de enraizar a presença no aqui e agora.

(por Artur Scarpato)

Os Quatro Padrões de Resposta Frente ao Perigo: lutar- fugir – congelar – desfalecer

A reação de ansiedade/medo faz parte de um sistema de comportamento defensivo construído pela evolução para enfrentar perigos. Este sistema detecta um perigo e produz respostas que visam aumentar a probabilidade de sobrevivência numa situação avaliada como perigosa.

Há algumas reações básicas que o organismo apresenta numa situação de perigo. A fórmula mais conhecida de resposta de “luta ou fuga”, na verdade se compõe de quatro direções básicas de respostas comportamentais: luta, fuga, congelamento ou desfalecimento.

Vamos imaginar que nos deparamos com um animal perigoso. Se nosso cérebro interpretar que podemos enfrentar o animal, nosso corpo se organiza para enfrentar ou intimidar o animal.

Porém se o animal parecer muito grande ou perigoso para nossos recursos, a resposta que se organiza é de fuga. Se não houver possibilidade de fuga, uma resposta possível é a de paralisia, de congelamento, como uma estratégia de tentar passar despercebido. Caso o ataque seja avaliado como iminente pode surgir uma resposta de desfalecimento para tentar pacificar o inimigo ou de desmaio para nos proteger de sentir a dor do ataque.

Assim estas quatro reações pré-organizam comportamentos que teriam diferentes funções numa situação de perigo:
(1) de agressão (mostrar-se perigoso, atacar ou revidar)
(2) bater em retirada (evitando o perigo, fugindo)
(3) de imobilização (paralisar-se, quando fugir é inviável)
(4) de desfalecimento (submissão/pacificação ou desmaio para não sentir a dor)

Estes padrões de resposta reaparecem mesmo quando a fonte de perigo é interna, seja uma sensação corporal como na Síndrome do Pânico, uma situação de avaliação social como na Fobia Social ou uma reativação de uma lembrança traumática como no Estresse Pós Traumático.

Em todas estas situações há uma hiperativação do circuito do medo que dispara padrões pré-organizados de comportamento na presença de um suposto perigo.

Numa crise de ansiedade o corpo vai esboçar alguma destas respostas frente ao perigo, notadamente uma das três últimas: fugir, paralisar ou desfalecer.

Esta variação de respostas explica porque, por exemplo, algumas pessoas reagem numa crise de ansiedade com agitação, outras com paralisia, enquanto outras reagem com uma sensação de amolecimento e sensação de quase desmaio.

(por Artur Scarpato)

Trabalhar a ansiedade através do corpo e das cognições

A experiência humana é integrada. A ansiedade, que é um fenômeno emocional, se manifesta também nos níveis corporal e cognitivo.

No plano cognitivo ela aparece como preocupações, catastrofizações, antecipação de perigos, etc.

No plano corporal se expressa em tensões musculares, taquicardia, respiração curta, pelos eriçados, etc.

No plano emocional a ansiedade é vivida como estados de apreensão, medo e aflição, por exemplo.

A experiência clínica mostra que um bom caminho para regular a ansiedade – uma emoção – está em mudar os outros dois níveis, o corpo e as cognições.

Para isto, há técnicas através das quais podemos modular os estados corporais e há técnicas pelas quais podemos transformar o funcionamento cognitivo.

Por exemplo, se regularmos a tensão do corpo, a ansiedade diminui e a mente fica mais serena.

Se mudamos as cognições e olhamos as coisas de uma perspectiva mais objetiva, a ansiedade diminui e o corpo desacelera.

Toda emoção, regulada ou des-regulada, ocorre também nos níveis corporal e mental. Mudando um, mudamos os outros dois.

Na psicoterapia dos transtornos ansiosos, geralmente vamos trabalhar por dois caminhos principais:

1 modular o corpo e assim regular a emoção (ansiedade) e a mente

2 reestruturar os pensamentos distorcidos e assim regular a emoção (ansiedade) e o corpo

Podemos caminhar tanto pela via corporal como pela via cognitiva. Para isto há técnicas específicas utilizadas em psicoterapia.

Para regular o corpo há técnicas importantes de psicoterapia corporal, como controle respiratório, auto-gerenciamento do tônus muscular, relaxamento, exposição interoceptiva, etc

Para regular as cognições há técnicas como desenvolver um eu observador, identificar os pensamentos automáticos, reestruturar as crenças, etc

Algumas pessoas podem preferir uma ou outra destas vias de entrada, mas numa situação ideal, trabalhamos pelas duas vias.

Alguns transtornos reagem melhor a um enfoque inicial mais cognitivo como no Transtorno de Ansiedade Generalizada e no Transtorno Obsessivo Compulsivo. Outros reagem melhor a um enfoque inicial mais corporal como no Transtorno do Pânico, nas Fobias e no Estresse Pós Traumático. No Transtorno do Pânico, por exemplo, as técnicas de controle respiratório, gerencimento do tônus muscular e exposição interoceptiva são clássicas.

Enfoque maior não significa exclusivo, pois a efetividade depende de um trabalho integrado.

(por Artur Scarpato)

Uma técnica clássica de respiração para diminuir a ansiedade

Há uma técnica clássica de respiração utilizada para o gerenciamento da ansiedade. É o que vamos chamar de respiração quadrada.
Quadrada porque é feita em 4 etapas e todas com a mesma duração.
É como um quadrado, uma forma com quatro lados iguais. Neste caso, é uma respiração feita em quatro etapas, com duração semelhante.
As quatro etapas são: inspiração, pausa cheio, expiração e pausa vazio.

Veja como fazer.
Preparação:
Sente-se confortavelmente. Observe a sua respiração, percebendo o ritmo da sua respiração. Coloque a sua atenção no seu corpo, deixando todo o resto de lado. Mantenha a boca fechada durante o exercício deixando a respiração acontecer suavemente pelas narinas.

Agora inicie:
1 Deixe o ar entrar em seu corpo, enquanto você conta lentamente até três: um….dois….três….
2 Segure o ar nos pulmões, contando lentamente até três.
3 Solte lentamente o ar, contando lentamente até três.
4 Após a expiração mantenha-se sem ar, contando lentamente até três.
1 Volte ao passo 1 e continue repetindo este ciclo, sem pressa…

Faça inicialmente estes ciclos por um minuto e veja como você se sente.
Se estiver bem, retome e aumente o tempo de exercício para 3 minutos.
Agora pare o exercício e se observe.
Se você tiver feito o exercício corretamente provavelmente vai estar se sentindo mais relaxado e menos ansioso.

Se estiver sentindo tontura é provável que você exagerou um pouco nas etapas de inspiração e expiração e não deu as pausas necessárias.
É muito importante um equilíbrio entre as quatro etapas. As pausas são tão importantes quanto inspirar ou expirar.
A tontura tende a passar sozinha, mas se você quiser ajudar a diminuir a tontura, retome o exercício com o cuidado de fazer a respiração DEGAVAR, SEM PRESSA, respeitando cada etapa: inspiração, pausa cheio, expiração e pausa vazio.
O exercício deve ser confortável. Se sentir desconforto, pare e deixe para fazer outro dia.

Você pode achar mais confortável contar até 4 em cada etapa, não importa; o importante é manter uma respiração lenta e regular, em quatro etapas. Faça uma contagem mental, você não precisa falar os números. Mantenha a boca fechada e respire pelo nariz.

Se o exercício te ajudar, pode praticá-lo todo dia.
Se quiser, você pode aumentar o tempo do exercício, fazer 5 ou 10 minutos de cada vez.

Sob estado de ansiedade a respiração tende a ficar rápida e superficial e a pessoa frequentemente tem a sensação de não ter ar suficiente. Este exercício corrige esta distorção, ajudando a diminuir o estado de hiperventilação, que causa várias sensações típicas do estado ansioso como tontura e formigamento.

Este exercício é um CALMANTE NATURAL, um típico trabalho de auto-gerenciamento.

Ao trabalhar com a ansiedade precisamos aumentar o sentimento de potência, aprender como podemos influir sobre nosso estado interno.

(por Artur Scarpato)

As estratégias de evitação e seu fracasso

A pessoa tomada de ansiedade busca modos de diminuir este estado que a assusta tanto. Há duas estratégias que merecem atenção, dois caminhos de evitação: a evitação comportamental e a evitação mental. As duas são estratégias mal sucedidas, apesar de amplamente utilizadas.

Na evitação comportamental, a pessoa evita fazer algo que possa levá-la a se sentir ansiosa. Se a pessoa teme ir num shopping, evitará ir para não passar mal. Se ela teme ficar sozinha, criará estratégias para não ser deixada sozinha e assim tentará evitar a ansiedade. O problema com a evitação comportamental é que a pessoa desvia da ansiedade, mas não a supera. Ao contrário, a cada desvio ela reforça em sua mente a crença na força “negativa” da ansiedade, com a idéia de que teria passado mal se tivesse ido, teria sido terrível… Neste processo a pessoa vai perdendo terreno para a ansiedade e vai limitando a sua vida.

Na evitação mental a pessoa se ausenta mentalmente, sua atenção se distancia e ela não percebe o que sente, sua presença fica dispersa. Ela tenta evitar a ansiedade ao tentar não percebê-la. Através de uma desconexão interna, a consciência se afasta do corpo, que é a fonte das sensações e emoções. O problema com esta estratégia é que a ansiedade é uma emoção natural que vai inevitavelmente fazer-se presente. Uma pessoa desconectada tende a estranhar e se assustar muito mais com tudo que sente em seu corpo, logo o tombo será muito maior. O afastamento mental faz com que as emoções e sentimentos percam a “naturalidade” para a pessoa, o que acaba por levá-la a se sentir ameaçada pelas próprias reações internas. A pessoa sente-se cada vez mais frágil e vulnerável, portanto mais sujeita a ansiedade.

Apesar de a evitação ser uma estratégia automática e parecer razoável, o melhor caminho é justamente o oposto. Para superar a ansiedade e o medo da própria ansiedade, é necessário seguir um caminho que parece menos natural, mas que é muito mais eficaz: aproximação gradual, aumento de tolerância à excitação interna, resignificação da experiência e enfrentamento.

A idéia de aproximação gradual e enfrentamento pode assustar, pois há sempre um “risco de inundação”, quando a pessoa sente uma ansiedade tão forte que se sente derrotada, como se tivesse voltado à estaca zero.

Para ser eficiente, este processo é feito numa psicoterapia especializada, com orientação de um psicólogo, para se poder fazer um enfrentamento controlado e gradual das situações temidas ou das sensações temidas. Este processo é importante em todas os casos onde há fortes crises de ansiedade como Pânico, Fobia, Fobia Social e Estresse Pós Traumático.

(por Artur Scarpato)

Intensidades e Cognições: as duas dimensões da ansiedade

O ser humano apresenta uma dimensão intensiva, de excitações emocionais e físicas e uma dimensão cognitiva, de processamento de informação e atribuição de sentido.
Na psicoterapia atuamos sobre estas duas dimensões, tanto regulando as intensidades através de técnicas de auto-gerenciamento e da regulação pelo vínculo, como trabalhamos para reestruturar o processo cognitivo.
Nos transtornos ansiosos encontramos um desequilíbrio nestas duas dimensões: um desequilíbrio de intensidades e uma distorção no processamento de informações.

No estado ansioso há uma superativação das dimensões intensivas, das respostas fisiológicas e emocionais. A pessoa fica num estado fisiológico alterado, apresentando geralmente, respiração acelerada e superficial, coração acelerado e irregular, suor, tensão muscular, etc, assim como num estado emocional alterado, sentindo ansiedade, medo, insegurança, inquietação, apreensão, etc.

O estado ansioso crônico acompanha-se também de uma distorção na dimensão cognitiva, que leva a pessoa a ter pensamentos catastrofizantes, preocupações e ruminações, vendo as situações como ameaçadoras, interpretando suas reações físicas como perigosas, sofrendo com seus pensamentos invasivos, etc.

No tratamento precisamos atuar sobre estas duas dimensões, quantitativa – intensiva e qualitativa – cognitiva.

Para trabalhar com a dimensão intensiva, podemos utilizar várias técnicas, como recursos de controle respiratório, regulação das tensões musculares, modulações da postura, técnicas de relaxamento etc. Através destes trabalhos conseguimos que a pessoa desenvolva uma boa capacidade de regulação fisiológica e emocional, diminuindo significativamente sua ansiedade. Outro foco importante no trabalho com as intensidades é utilizar técnicas para aumentar a tolerância à excitação interna. Para isto, utilizam-se técnicas de exposição gradual, desensibilização, etc.

No trabalho cognitivo, por sua vez, ensinamos a pessoa a se auto-obervar, a identificar e analisar criticamente os pensamentos automáticas negativos e potencializar sua capacidade de dirigir voluntariamente o foco de atenção.

O trabalho sobre a dimensão intensiva tem um efeito atenuador sobre a dimensão cognitiva, com enfraquecimento do circuito mental da ansiedade, dos pensamentos negativos e preocupações. O trabalho sobre a dimensão cognitiva tem um efeito de tranquilização e diminuição da excitação emocional e fisiológica, numa interação recíproca.

Dentro deste princípio várias técnicas podem ser articuladas para ajudar as pessoas a saírem de seu estado ansioso crônico e suas crises agudas.

(por Artur Scarpato)

Um modo de regular os afetos através do vínculo

As pessoas com Síndrome do Pânico e outras formas de ansiedade frequentemente relatam se sentirem isoladas e desconectadas do mundo. Quando estamos muito isolados nos sentimos mais vulneráveis e expostos aos arroubos de ansiedade e desamparo. Deixamos de contar com um recurso valioso que é a regulação emocional através do vínculo.

Tente um experimento simples.

Preste atenção no seu corpo e veja como você está se sentindo, como está a sua respiração, o tônus dos seus músculos, observe as qualidades de sensações que emergem de seu corpo.

Agora aproxime-se de alguém que você gosta e confia. Toque esta pessoa – de preferência sem ela “saber” de sua intenção. Faça um toque que possa ser mantido por um tempo, pelo menos um minuto ou mais. Pode ser, por exemplo, segurando a mão da pessoa, tocando uma parte de seu corpo, encostando seu corpo no dela, etc.
Toque e deixe-se ser influenciado por esta conexão. Se entregue e permita que um corpo possa influenciar o outro.

Um resultado possível é você descobrir o efeito que um corpo exerce sobre o outro.
Através do toque, por exemplo, uma mãe pode acalmar uma criança ansiosa, um amigo consolar o outro desolado, ou um pai comunicar segurança (ou insegurança) ao cumprimentar o filho.
O toque tem um enorme poder de comunicação e de regulação dos estados afetivos entre dois corpos.

Pode ser que você se sinta melhor com este experimento e queira repeti-lo outras vezes. Pode ser que não seja uma experiência tão boa, mas que você queira repetir para aprender algo mais sobre você e sobre o vínculo com a pessoa que você escolheu.

Hoje o blog faz 1 ano. Motivo de comemoração! O feedback dos leitores tem sido muito positivo. Espero que este segundo ano seja produtivo e útil aos leitores.

(por Artur Scarpato)

Emoção muito intensa ou baixa tolerância? O dilema da ansiedade nos casos de Pânico

Podemos ver dois lados numa pessoa ansiosa e “assustada” com seus acessos de ansiedade.
Por um lado a vemos como alguém com excesso de emoção, alguém que reage com intensa ansiedade a cada mudança na paisagem interna, de emoções e reações corporais.
Este seria um desequilibrio quantitativo. Para lidar com ele utilizamos várias estratégias para diminuir a ansiedade, como técnicas psicológicas de auto-gerenciamento ou medicação.

Mas há também um desequilíbrio qualitativo. Geralmente a pessoa com algum Transtorno Ansioso tem uma tolerância muito baixa à excitação interna . Ela pode sentir qualquer coisa, numa intensidade baixa e já se assustar, ficar ansiosa. Uma pequena estimulação interna já deixa a pessoa alerta, antecipando algum risco… Para ela, pouco já é muito. Ela é como um estômago sensível demais.

Para lidar com esta intolerância à excitação interna é importante ampliar a capacidade de acolher as reações internas, tolerar suas intensidades e começar a discriminar as diferentes sensações e sentimentos.

Integrando os dois aspectos, podemos observar que, para uma pessoa com baixa tolerância à excitação interna, qualquer estimulação pode levar facilmente à sensação de inundação e ansiedade .

Assim, é necessário não só regular a ansiedade – com técnicas psicológicas e/ou medicação – para diminuir o “risco de inundação”, mas é fundamental aumentar a tolerância interna às reações internas, físicas e emocionais.

(por Artur Scarpato)

Uma técnica simples: sintonizar com a barriga

É importante para uma pessoa ansiosa aprender meios para diminuir sua ansiedade, sua agitação, seu desconforto e seu medo.
Vamos dar uma dica simples que pode ajudar, um exercício de toque e auto-observação.
1 Primeiro, sente-se numa posição confortável.

2 Agora, simplesmente observe a sua respiração. Observe sem interferir, sem querer aumentá-la ou diminuí-la. Quando observamos a respiração podemos observar coisas distintas como, por exemplo, a sensação do ar que entra e sai de nossas narinas ou então a sensação de nossa barriga que se move conforme a respiração ocorre.
Escolhemos um foco para nos concentrar. Observe que conforme a respiração acontece, partes de seu corpo se movem. Talvez você perceba que seu tórax se mexe e talvez você perceba que sua barriga também se mexe.
Observe se a sua barriga se move conforme você respira. Observe sem interferir. Na respiração natural, a barriga expande conforme o ar entra e se contrai conforme o ar sai.
Se a barriga ficar imóvel, não se preocupe, continue o exercício do mesmo modo. Se sentir algum desconforto, não precisa continuar o exercício.

3 Agora coloque as duas mãos abertas sobre a sua barriga para te ajudar a sintonizar com esta área. Mantenha suas mãos relaxadas tocando sua barrriga.
Deixe a barriga solta, relaxada. Não force, não faça nenhum exercício respiratório, apenas observe e aceite sua respiração como ela ocorre.

4 Vá percebendo as sensações que brotam de sua barriga. Podem ser tanto sensações agradáveis ou desagradáveis, não importa. O importante é você se conectar com sua barriga. Sinta o contato de suas mãos com a barriga e perceba as sensações que surgem deste contato. E perceba as sensações que nascem de sua barriga.

5 É simples: manter as mãos relaxadas sobre a barriga e observar as sensações que surgem. Observe se a sua barriga se mexe enquanto a respiração acontece. Deixar a barriga relaxada ajuda para que ela se mova com a respiração. Simplesmente observa a respiração “chegando” na barriga e massageando seus órgãos internos. Deixe que a barriga seja o seu centro.

6 Se surgirem sensações agradáveis, feche os olhos e deixe estas sensações boas se espalharem pelo de seu corpo.
Se as sensações forem desagradáveis, aceite-as e se possível mantenha a barriga relaxada, a respiração solta, sem controlá-la e espere que seu corpo vá naturalmente se auto-regulando.
Depois de alguns minutos observe se houve alguma mudança em seu estado interno. Se te deixou mais calmo, pode utilizá-lo algumas vezes ao longo do dia.

Este exercício utiliza dois princípios importantes no gerenciamento da ansiedade: o controle da atenção e a ativação, mesmo que indireta, da respiração diafragmática, abdominal.

(por Artur Scarpato)

O adulto e a criança dentro de si

A pessoa com algum transtorno de ansiedade vive uma situação paradoxal. Por um lado, vive com intensos sentimentos de insegurança e vulnerabilidade, e ao mesmo tempo, tem que dar conta de diversas responsabilidades e tarefas da vida adulta. É como se a pessoa estivesse dividida: tem um lado adulto e responsável convivendo – e às vezes se alternando – com um lado infantil e inseguro. Este contraste pode fazer com que a pessoa se sinta confusa e desorientada. Muitas vezes a pessoa começa a se cobrar, se criticar, não aceitando seu lado inseguro: “mas eu não deveria me sentir assim, eu tenho que ser forte…”. A não aceitação do medo torna a pessoa ainda mais insegura, pois ela passa a ficar com medo de ser dominada pelo medo.
O caminho está em aprender a usar seu lado adulto para cuidar e ajudar seu lado infantil e inseguro.
Imagine uma criança com medo de trovão. Um adulto que a critica e grita com ela, exigindo que ela vença seus medos dificilmente vai ajudá-la a superar usa insegurança. Do mesmo modo, o adulto que se tranca no quarto junto com a criança, fechando as janelas para que os trovões fiquem longe, tampouco ajudaria. A melhor atitude, no caso, seria reconhecer o medo que a criança está sentindo, segurar na sua mão para acalmá-la, conversar e ajudá-la a entender o que acontece e só depois convidá-la a se aproximar da janela, olhar a chuva, os raios e assim começar a enfrentar a situação temida…
O enfrentamento dos medos irracionais é a melhor estratégia para domesticá-los, porém este caminho só funciona se a atitude for primeiro, de aceitação do próprio medo.
Depois, é importante uma atitude de apoio incondicional para ajudar a criança a ir perdendo o medo de sua reação emocional, perder o medo de sentir medo para, então ir perdendo o medo dos raios e trovões.
Esta atitude do adulto que ajuda uma criança a superar seus medos é a mesma que uma pessoa ansiosa precisa ter consigo mesma, esteja ela com Transtorno do Pânico, Fobia Social, Estresse Pós Traumático, etc. Seu lado adulto precisa pegar na mão de seu lado infantil e assustado e ajudá-lo a aceitar o sentimento, gradativamente ir olhando seus temores para perder o medo do que sente e aprender a olhar com mais lucidez para as conseqüências catastróficas temidas, para ver como o monstro não é tão perigoso quanto parecia.

Tornar a solidão uma experiência suportável

Numa das variedades do Transtorno de Pânico, além do medo das reações do corpo, há um fator adicional, onde estar acompanhada de alguém de confiança pode fazer muita diferença. As pessoas deste grupo geralmente se sentem mais vulneráveis a ter crises de pânico quando estão sozinhas e são muito sensíveis a separações e ameaças de separação.
Vamos encontrar muitos traços desta ansiedade de separação que vem da infância, podendo ter diminuído ou sumido por anos, mas que reaparecem com o Pânico. É comum que durante a terapia a pessoa vá lembrando de medos da infância, como medo de perder um dos pais, de ficar sozinha, de dormir sozinha, etc.
Para uma criança muito pequena o abandono poderia representar a morte, o que justifica o intenso estado de angústia e desespero que poderia se ativar nesta situação. No entanto, a mente da pessoa adulta com Transtorno do Pânico parece reagir do mesmo modo, com ansiedade e forte sentimento de vulnerabilidade quando se vê sozinha.
No trabalho com adultos com Pânico precisamos ajudar a pessoa a lidar com esta ansiedade de separação e com este medo de ficar sozinho. Em parte isto implica em retomar e elaborar traumas relacionados a abandono, perda de confiança e isolamento, sendo que alguns destes traumas têm origem bem precoce, na infância.
Porém, uma meta importante é ajudar a pessoa a experienciar a solidão e viver a solidão como uma experiência suportável, uma experiência que pode ser desagradável, emocionalmente dolorida e produzir ansiedade, mas possível de ser vivida sem levar ao desespero e ao pânico. Esta é uma das metas de uma psicoterapia para pessoas com Pânico.